Já em mil novecentos e vinte; devia-se pensar no que falar a um menino. O que se diz a um adolescente pode mudar mais de um destino.
Foi assim que ocorreu com o fazendeiro Inácio.
Homem trabalhador e de grande sabedoria. Pois ao proferir uma simples frase não
imaginou que conseqüências ela traria.
Seu
Inácio tinha uma fazenda de médio porte. Dono de invejável saúde considerava-se
um homem de muita sorte. Bem casado com sua esposa; dona Margarida. Vivia feliz
e estava sempre de bem com a vida.
Para
a época até que ele era um homem extrovertido. Contrariava a regra de que para
ser honesto tinha que ser sisudo.
Seguia
feliz, com a mulher e suas dez filhas. Que para ele eram bem mais que tudo!
Às
vezes, porém sentia-se incompleto por não ter um filho homem, para dar
continuidade ao seu nome. Mas logo se conformava
Teria
netos apesar de que não levariam o seu sobrenome.
Sabia
que Deus escreve certo através de linhas tortas. E que a verdade aparece
sorrindo ou chorando, em nossas portas!
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E
foi exatamente assim que aconteceu. Quando na porteira de sua fazenda um menino
apareceu. Tratava-se do menino Virgílio. O mais jovem caixeiro viajante. Nunca
vira um negro assim tão negro. Nem um menino tão falante. Tão logo chegou foi
se apresentando. Disse quem era e que vinha. Afirmou ser um lavrador, sem
terras. Virava-se com o que tinha.
Enquanto
falava abria as suas mochilas. Que estavam no lombo de seu velho pangaré.
Disse: - Fazendeiro não se assuste; cada um é aquilo que é!
Não
foi uma frase muito sábia, porém enorme foi o efeito que causou.
Inácio
que não era nenhum burro compreendeu. Por isso; a esposa e filhas ele chamou.
As
moças ficaram abismadas. Como cabiam tantas coisas em algumas mochilas e
sacolas. Ali havia de tudo um pouco, desde perfumes até pequenos brinquedos e
algumas bolas!
Dona
Margarida que estava precisando de agulhas e linha pediu ao menino que lhe
mostrasse o que tinha.
Já
Esmeralda a terceira filha; queria algumas revistas para ler. Virgilio
respondeu que não tinha, pois ninguém as pedia. Mas que no próximo mês iria
trazer.
Prometeu
e assim o fez. Trouxe uma enorme pilha de revistas no outro mês!
Um
a um todos daquela família se afeiçoaram ao tão expansivo menino.
Esmeralda
se esbaldava com as histórias que ele contava. Dizia ele serem todas verdadeiras.
Mas a grande maioria ele inventava.
Falava
sobre como enfrentara supostos salteadores. Sobre as donzelas que por ele
suspiravam de amores. Sobre fantasmas que ele encontrava nos caminhos. Sobre
colher as flores sem espetar-se nos espinhos.
De
vez em quando ele declamava alguma poesia que dizia ser de sua autoria.
Esmeralda aplaudia. Apreciava sua companhia!
Até
o dia em que o senhor Inácio disse. Sério, porém em tom de brincadeira:- Vejo
que gosta de minha filha; toda esta prosa não é à toa. Nunca se cansa de falar?
Quando
puder sustentar família poderá com ela se casar.
Foi
esta a frase que deu sentido a esta história. Virgílio saiu puxando seu cavalo
com ela tatuada na memória.
Tinha
dezessete anos e algumas economias. Continuou economizando, e a seus clientes
(fregueses) visitando.
Virgílio
passou a ver a vida como uma coisa muito boa. Naquela fazenda de doze moradores
ele só via uma pessoa.
Sabia
que quem deseja uma boa colheita a terra lavra. Quando via seu Inácio tirava o
chapéu e dizia: - Eis aí um homem de palavra!
O
pai de Esmeralda não entendia por que aquela frase a todo instante.
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Esquecera-se
de sua promessa. Quem não esqueceu foi o menino falante!
Esmeralda;
a jóia de Virgílio era a maior força de trabalho daquela pequena fazenda.
Manejava como ninguém a enxada; representava uma grande fonte de renda.
Haviam
se passados quatro anos desde a primeira visita do jovem caixeiro. Era uma
manhã de verão e Itatiba resplandecia. Foi naquela linda manhã que, com a alma
cheia de esperança. O auspicioso viajante fez a sua mais importante cobrança.
Mal
botou os pés na fazenda, disse à Esmeralda que o recebeu para que chamasse o
pai naquele momento. Que era chegada a hora de falarem sobre o casamento.
O
velho Inácio que não esperava por aquela situação. Disse que falaria com o
pretendente da filha em outra ocasião. Alegando estar bastante ocupado não foi
visto naquela semana, na fazenda ou no povoado.
Ao
retirar-se aparentando muita sinceridade Virgílio disse a Esmeralda. Confio em
seu pai. É um homem de verdade!
Disse
isto para que a filha contasse ao pai. Que sempre disse que um homem que falta
com a verdade, a si mesmo trai!
Mesmo
assim Inácio não amoleceu e escondeu-se de Virgílio enquanto deu!
Até
que um dia perguntou à filha:- quer se casar mesmo com este falastrão? Ela
respondeu:- foi o senhor quem prometeu. Como posso dizer que não?
Resignado
Inácio compreendeu que o que está feito não está por fazer. Decidiu que após a
próxima colheita o casamento iria acontecer.
Virgílio,
então com seus vinte anos não cabia em si de contentamento. Dizia-se o homem
mais feliz acabara ali sua vida de estradeiro. Enfim criaria raiz!
Com
suas economias comprou um pequeno sitio a alguns quilômetros da cidade de
Itatiba. Cidade de da qual aprendera a gostar. E aonde, futuramente iria com
sua querida Esmeralda passear!
Enfim
veio a colheita mais esperada, por Virgílio que nada havia plantado. Além de um
grande amor com que sempre havia sonhado.
No
dia do casamento como para que se consolar. Inácio disse mais uma frase infeliz
daquelas que se dizem sem pensar: - Está desencalhada; uma boca a menos para
alimentar!
Acredito
que com o passar dos anos Inácio não mais prestava atenção no que dizia. Pois
Esmeralda não consumia nem a décima parte do que com seus braços fortes na
lavoura produzia. Ao invés de dizer uma boca a menos para alimentar. Deveria
dizer:- dois braços a menos para trabalhar!
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Em
um aconchegante ranchinho à beira do lago, Virgílio e Esmeralda de Castro
construíram seu lar.
Viviam
do que colhiam e das quinquilharias que Virgílio continuava a negociar!
Se
não viviam na fartura. Tampouco alguma coisa lhes faltou. A vida não lhes
pareceu tão dura!
Porém
havia um fato que Esmeralda nunca conseguiu explicar. Por que o pai, mãe irmãs
nunca a vinham visitar?
Este
fato deixava o bom negro Virgílio um tanto quanto revoltado.
Triste
dizia à mulher: - quem não visita não quer ser visitado.
É
um dos muitos mistérios que a vida tem desde o casamento ninguém visitou
ninguém!
Até
o dia em que seu Inácio mandou um recado. Queria se encontrar com a filha na
cidade. Frisou que ela deveria ir. Era algo de extrema prioridade.
Virgílio
ainda brincou: - Leve a bolsa de couro de carneiro. Quem sabe, o generoso velho
vai lhe dar muito dinheiro!
Não
deu dinheiro nenhum. Nem aquele encontro trouxe beneficio algum. O pai queria
apenas da filha se despedir. Havia vendido a fazenda e iria partir.
Estava
sentindo-se velho demais para a lavoura. Queria mostrar as filhas, que a vida
não era apenas plantar e colher, milho feijão e cenoura!
Com
o dinheiro da venda da fazenda conseguiu, um bom sobrado na capital comprar.
Com o que havia restado, daria para se arranjar!
Foi
aquela a última vez que Esmeralda viu o pai. Já estava acostuma da sem ele, a
mãe e as irmãs. Por isso não proferiu um simples ai.
Quem
é do campo não se acostuma na cidade. Esta é uma verdade que até hoje
prevalece.
Quem
não é feliz onde foi criado. Sofre muito em um lugar que não conhece!
Com
o fim do dinheiro seu Inácio foi trabalhar na construção civil. As filhas
tiveram que trabalhar na área industrial. Foi quando perceberam que vender a
fazenda foi um erro fatal!
A
alimentação da cidade foi para seu Inácio o maior veneno
A
densa e fria garoa foi para ele algo letal.
Pois
naquele tempo, a tuberculose ainda era uma doença fatal.
E
foi assim naquele lindo sobrado. Quando mal enterravam alguém que estava
partindo. O sintoma da cruel moléstia, outro já estava sentindo.
Dos
onze que partiram. Os onze viraram história. Para Esmeralda. Pai mãe e irmãs era
apenas memória.
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Volta
e meia o bom Virgilio dizia a mulher querida:- Uma promessa em tom de
brincadeira fez diferença entre a morte e a vida!
Tudo isto parece um drama, mas quando a arte não imita a
vida; a vida imita a arte.
Desta
historia que não acabou e nunca acabará muita gente ainda faz parte.
Pois
Esmeralda e Virgílio tiveram oito filhos, sendo três homens e quatro mulheres.
Todos
se casaram e tiveram filhos e filhas saudáveis.
Por
isso é que digo, que esta história nunca irá se acabar.
Pois
cada personagem. Um novo capítulo irá criar.
Virgílio de Castro. Que nunca se deu por vencido, nem era regido por nenhuma lua.
Que
sabia o que queria, e sempre lutava para atingir sua meta. Se a biografia dele
se parece com a sua?
Ou
se tem pretensão de ser poeta?
Consulte
sua árvore genealógica.
Às
vezes o que nos parece absurdo tem alguma lógica!
Lemos quarta-feira, 23 de abril de 2003. 20h03min.
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